Saúde Animal

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O Killiofilo e o Biotopo

Falar sobre Killifishes, sua distribuição pelo mundo, em nosso país e estado, a pressão sofrida por parte de seu maior predador, o homem, é importante para o conhecimento teórico dos mesmos. Entretanto, para conhece-los na prática é preciso estudar seus costumes e aprender a identificar os locais onde habitam.
Como já foi citado, no Rio de Janeiro os Killifishes são representados pela família Rivulidae, e dentro da mesma pelos gêneros Rivulus e Cynolebias.
Os Rivulus podem ser encontrados em dois tipos de biótopo.
– MANGUE – estes ambientes se localizam próximo a orla marítima, e são constituídos por vegetação típica de áreas pantanosas, banhadas por água do mar. São árvores de pequeno a médio porte que possuem raízes aéreas. O solo é formado por lama fina e compacta, de cor marrom escuro a negro, apresentando uma alta concentração salina.
– RIACHOS – estes ambientes são localizados em florestas ou em baixadas cobertas por vegetação de pequeno porte.

Podemos encontrar Rivulus em um terceiro tipo de biotopo, o qual seja pequenas lagoas perenes, entretanto, estes peixes provém do transbordamento de riachos próximo a lagoa, motivo pelo qual não considerei as mesmas como biótopo natural.
Na estrada da Barra de Guaratiba (zona oeste) encontramos algumas áreas de manguezais, nas quais habitam Rivulus caudomarginatus e Rivulus ocellatus. O primeiro é encontrado em dois padrões de cor, azul e vermelho, e o segundo possui uma particularidade única, que consiste em ser hermafrodita.

Estes ambientes estão sendo destruídos de diversas maneiras, dentre as quais podemos citar:
1 – A água das marés, que banha os mangues, traz resíduos de lixo e esgoto, residencial e industrial, que ao serem depositados sobre o solo formam uma camada polidora, que lentamente destroi a cadeia de vida animal e vegetal existente no mangue.
2 – Os coletores de caranguejos e de madeira para lenha ou para peças de ornamento, que além de destruírem a vegetação, desfiguram o solo ao escavarem as tocas dos caranguejos, para retirá-los, como também ao arrastarem sacos contendo os mesmos, e amarrados de lenha colhidos para os citados fins.
3 – Os aterros clandestinos feitos com o fim de obter terrenos para construção de residências, que destroem grande parte dos mangues, cujo restante é lentamente degradado pelos novos moradores (o homem).
É importante ressaltar que, as duas primeiras situações são perfeitamente reversíveis, se detidas em curto prazo, ao contrário da terceira, que após perpetuada (como sugere a ação) torna-se definitiva.
Os ambientes de floresta e de baixada, onde habitam Rivulus Brasiliensis e Rivulus Santenses respectivamente, ainda podem ser encontrados em áreas localizadas distantes dos perímetros urbanos, como Magé, Nova Iguaçu (interior), Japeri e cercanias , e próximo a bases das serras de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo. Ao se localizar um desses biótopos, deve-se ter o cuidado de não modificar o ambiente, principalmente preservando a vegetação local, pois são vulneráveis a mudanças bruscas e após degradados, dificilmente se recuperam.
Os biótopos caracterizados como de baixada, são localizados em áreas normalmente utilizadas como pastagem de gado bovino, o que traz grande vantagem com relação ao desenvolvimento da população, como veremos em oportunidade propícia, encontrando-se os mesmos na parte mais baixa (depressão) do terreno, sendo resultado do acúmulo de água da chuva e possuindo a maior parte de sua área ocupada por taboas (Typha sp.), e suas margens são cobertas de gramíneas. Como exemplo típico deste conjunto de características, podemos citar o biótopo localizado em Seropédica (Itaguaí). Também encontramos estes ambientes em terrenos mais baixos, que margeiam algumas rodovias em nosso estado. Como exemplo podemos citar a rodovia Rio Santos, no trecho compreendido entre Santa Cruz e Itaguai (zona oeste), na antiga Rio-São Paulo, na altura do Km 40 logo após a ponte sobre o rio Guandu, bem como uma infinidade de outras poças com estas características, situadas em uma área entre Campo Grande, Santa Cruz e Itaguai. O biótopo de baixada é o que mais se aproxima (em características) aos biótopos de Nothobranchius na África, caracterizados como biótopos de savana.

Entretanto, esta não é a característica única de um biótopo de baixada, como pôde ser observado no biótopo próximo a Vila de Cava (Nova Iguaçu) que serve de habitat a uma população de Cynolebias nanus, cuja vegetação é constituída de Eleocharis acicularis, Nitella capillaris e gramíneas submersas. Outrossim, podemos encontrar biótopos de baixada cuja vegetação predominante seja constituída por um capim conhecido por capim navalha, o que caracteriza uma mudança drástica no solo do mesmo, normalmente representando um acréscimo acentuado de areia no ambiente. Porém, isto não impede que no biótopo exista uma população de killifishes (Cynolébias) em desenvolvimento. Chamo a atenção para o risco que corre o pesquisador desatento, com relação a manusear uma rede de coleta em meio a essa vegetação, pois a mesma, como sugere seu nome popular (capim navalha), poderá produzir cortes em seu corpo (principalmente nos braços) de considerável gravidade, Este tipo de biótopo pôde ser por mim analisado em 1992, quando de sua localização em Campo Grande (zona oeste), sendo o referido um exemplo perfeito de adaptação da natureza as modificações negativas que o homem impõe a mesma.
Os biótopos caracterizados como de restinga, estão distribuídos pela região dos lagos e são habitat de quatro espécies de Cynolebias, a saber C. citrinipinis, C. constanciae, C. whitei e C. cruzi. Estes biótopos são normalmente localizados próximo ao mar, pois as praias daquela região, quando em estado natural (livres de habitações), possuem uma configuração própria a formação dos mesmos, pois as areias terminam em leves dunas cobertas com vegetação típica, possuindo as mesmas outro declive contrário, terminando em uma baixada que acompanha toda sua extensão, Nesta baixada são formadas poças cujo conteúdo hídrico provém de água da chuva ou de lençol freático (C. citrinipinis), apresentando a água uma cor barrenta (água nova) a ligeiramente escura; o substrato é formado por areia fina misturada a resíduos decorrentes de matéria vegetal decomposta durante o período de secagem da poça, formando esta mistura um solo lamacento de textura leve; o PH é ligeiramente alcalino no início do período de cheia, devido à quantidade de material calcário (resíduos de conchas) existente no solo, passando a ácido no decorrer do período, sendo esta transformação motivada pela decomposição vegetal acima citada. Devido a aproximação com o mar, a água desses biótopos apresenta um pequeno teor de salinidade em seu conteúdo, e sua vegetação é bastante pobre, encontrando-se em seu interior Eleocharis e Nympheas, e nas suas margens a mesma vegetação encontrada nas dunas. Estas características se enquadram perfeitamente no biótopo de Cynolébias citrinipinis, localizado em Maricá.
Os biótopos caracterizados como de floresta, podem ser localizados em áreas de mata Atlântica preservadas em estado original, e são ambientes propícios a existência de Cynolébias sandrii, porém não fáceis de serem encontrados, devido á degradação que sofreu e ainda vem sofrendo este tipo de floresta em nosso país. Dos biótopos de Cynolébias existentes em nosso estado, considero este o mais vulnerável de todos, não só por encontrar-se em um ambiente tão ameaçado como principalmente por sua constituição. Os biótopos formam-se junto a base das florestas, isto é, na parte baixa que circunda as montanhas cobertas pelas mesmas. O substrato é formado por terra vegetal, proveniente de decomposição de raízes, folhas e outros resíduos da floresta, e coberto por folhas que caem das árvores. A água tem cor escura e pH ácido, além de temperatura amena, sendo o grau de umidade do ar alto, e mesmo no período de secagem do biótopo, seu substrato mantém alto grau de umidade, ao contrário dos demais biótopos de Cynolébias conhecidos. Estes fatores tornam o biotopo suscetível a acidentes, bem como pode ocorrer período de cheia sem que exista eclosão dos ovos enterrados no substrato, proveniente de períodos de cheia anteriores. Esta quantidade de fatores inconstantes, me deixa apreensivo com relação à existência atual de Cynolebias sandrii, pois como já tivemos oportunidade de comentar, estes biotopos que são em pequeno número e localizados em área restrita, foram palco de coletas indiscriminadas e irresponsáveis, e sabe Deus se a generosa Mãe Natureza poderá recuperar estes santuários, nos premiando com a oportunidade de podermos novamente observar tão belo peixe.

As pesquisas em biótopos de Cynolebias devem ser efetuados com planejamento, pois não se pode precisar a época exata em que encontraremos uma população de Killifishes anual. Entretanto o período mais propício ao encontro de populações ativas é a Primavera, dependendo da quantidade de chuva dentro do período. A primavera de 1992, foi a melhor dos últimos anos, pois com a grande quantidade de chuva, ocorrida no período, todos os biotopos conhecidos produziram populações; também foi possível a descoberta de novos biótopos e consequentemente novas populações.
É importante saber que o pesquisador deverá ser uma pessoa paciente e persistente, pois é normal encontrarmos biótopos com características positivas, isto é, totalmente cheio, com a água de coloração escura e pH em torno de 6.5 (água velha), vegetação bem desenvolvida, principalmente no seu interior, existência de uma grande variedade de vida aquática, como anfíbios, batráquios e insetos aquáticos como ninfas de (libélula), percevejos aquáticos (belostomídeos), larvas de besouros aquáticos (disticídeos) e grande quantidade de ostracódios, dáfnias, ciclopes, entre outros, sem apresentar qualquer vestígio de Killifishes. Porém é necessário que se proceda as anotações relativas a localização e características da poça, como: profundidade, temperatura da água (na superfície e no fundo), pH, DH, coloração da água, temperatura do ar, data e hora da coleta dos dados, e se existir habitantes próximos, levantar a data da ultima chuva ocorrida na área. Estes dados deverão constituir um mapa de controle, que receberá novos dados nas próximas visitas ao biótopo, que aconselho sejam feitas a espaço de 15 dias, e se possível periodicamente até a secagem do biótopo. Mesmo que após este acompanhamento, não seja encontrada uma população ativa, não quer dizer que a mesma não exista, pois pode ocorrer um ciclo completo de vida (cheia, evaporação e secagem) sem que aconteça a eclosão dos ovos existentes em seu substrato (exemplo: Cynolebias sandrii). É também importante que exista um conhecimento preliminar com relação ao tipo e localização (região) dos biótopos, bem como a configuração de cada espécie, para que possa identificar a população que for localizada. Estas são as características básicas a serem conhecidas por um pesquisador de campo.

Killifishes
O Killiofilo e o Biotopo.
Reprodução e perpetuação na natureza
Killifishes – Características Reprodutivas

Francisco Moutinho - piscicultor - Rio de Janeiro/RJ